Depois de ter admitido de que era um “candidato natural” à liderança da UNITA, o general Paulo Lukamba “Gato” decidiu não avançar com a sua candidatura. Com a “desistência” de Gato, nem mesmo a candidatura do general Abílio Kamalata Numa evitou que hoje se escrevesse o último capítulo da UNITA do Muangai, da UNITA de Jonas Savimbi. A tal UNITA que o Mais Velho dizia não se definir mas, apenas e só, sentir-se.
Por Orlando Castro
Numa das suas mais recentes intervenções o general “Gato” depois de se referir à história da UNITA, “sob a ímpar, visionária e corajosa liderança do presidente fundador e timoneiro, Jonas Savimbi”, lembrou o seu percurso nas “duas viragens fundamentais na história do nosso país, nomeadamente a Independência Nacional em 1975 e a institucionalização do Estado democrático de direito e economia de livre empreendimento em 1992”.
Paulo Lukamba “Gato” também recordou os momentos vividos após a morte de Savimbi e do vice-presidente António Dembo, quando a “UNITA, no quadro global da vida do nosso país, colocou sobre os nossos ombros e na nossa consciência a imensa responsabilidade de dirigir o partido no seu formato integral”.
O general também lembrou as tentativas de chegar à presidência do partido para citar os apelos recebidos agora: “Temos sido, durante os últimos três anos e com maior ênfase desde Dezembro de 2018, alvo de genuínos, sinceros e vibrantes encorajamentos provenientes de vários sectores do partido bem como da sociedade angolana em geral, com vista à nossa recandidatura a presidente da nossa UNITA”, escreveu Lukamba “Gato”, para quem “a candidatura a presidente do partido, no caso a UNITA, é uma decisão ideologicamente fundamentada, politicamente compartilhada de forma ampla e sólida para a unidade em torno do programa do Partido, por Angola”.
Entretanto, apesar desses apelos, aquele histórico do principal partido da oposição que o MPLA ainda permite que exista disse ter tomado a decisão de “apenas cumprir com o dever estatutário de eleitor activo, ideologicamente assumido, colocando-me desde já à inteira disposição do partido para poder desempenhar qualquer papel que o momento actual exigir”.
Assim, o congresso elegeu hoje o terceiro presidente da UNITA. Concorreram Adalberto da Costa Júnior, Raul Danda, Abílio Kamalata Numa, Alcides Sakala e José Pedro Catchiungo.
Adalberto venceu folgadamente pela livre escolha dos delegados da UNITA. E isso é quanto basta. Não é semelhante a nenhum dos dois anteriores líderes. Nem isso se esperava, se bem que possa ter muitos pontos de semelhança com Isaías Samakuva. Quanto a Savimbi, esse foi uma espécie única que nunca terá quem se lhe assemelhe.
Dizem alguns que “quem vai para o mar avia-se em terra”. Em Angola, mesmo ainda com Savimbi a comandar a luta, foram muitos os seus generais-pigmeus que se aviaram, que se venderam, ao MPLA.
Jonas Savimbi deve estar a dar voltas e voltas na campa. Afinal, ao contrário do que juraram muitos dos seus generais, bem como muitos dos seus políticos de elite, mais vale ser escravo e comer lagosta do que livre e alimentar-se de mandioca. Talvez agora Adalberto da Costa Júnior volte a provar mandioca.
No seio do Galo Negro todos parecem esquecer que a UNITA, por incapacidade dos seus mais altos dirigentes, assinou a sua própria certidão de óbito logo a seguir à morte de Jonas Savimbi, no dia 21 de Fevereiro de 2002.
E se a assinou com a morte em combate do seu líder, já a tinha rubricado quando alguns dos seus generais não só passaram para o outro lado, como aceitaram dirigir a caça a Jonas Savimbi. Foi o caso do general Geraldo Sachipengo Nunda. A verdade dói, mas só ela cura. Que disso se lembre o novo líder da UNITA.
Não adianta por isso continuar a dizer que a vitória seguinte começa com a derrota anterior. Isso faria sentido se o Mais Velho ainda andasse por cá. Como não anda e como os seus discípulos o que querem é apenas lagosta, ao povo que se alimenta da mandioca só resta passar também para o outro lado, mesmo ficando do mesmo lado…
É claro que Adalberto da Costa Júnior goza, terá de gozar, do benefício da dúvida. Será difícil acreditar que quem se alimenta regularmente de lagosta possa, de um momento para outro, render-se aos encantos da mandioca. Mas nunca se sabe. Agora que não pode desculpar-se com quem manda, veremos a ementa oficial e, sobretudo, se não vai à cozinha comer às escondidas.
Apesar de todas as enorme aldrabices do MPLA, os simulacros eleitorais acabaram sempre por derrotar em todas as frentes não só a estratégia mas a sua execução, elaboradas pelos “generais” da UNITA, nas quais Adalberto teve a sua quota de responsabilidade.
Esperando (santa ingenuidade!) que a Direcção da UNITA, esta ou qualquer outra, prefira ser salva pela crítica do que assassinada pelo elogio, de vez em quando ainda muitos pensam que é possível ver o Galo Negro voar.
O sacrificado povo angolano, mesmo sabendo que foi o MPLA que o pôs de barriga vazia, não viu na UNITA a alternativa válida que durante décadas lhe foi prometida. Será Adalberto capaz de fazer o Povo voltar a acreditar?
Terá sido para ver a UNITA de Samakuva que Jonas Savimbi lutou e morreu? Não. Não foi. Será diferente com Adalberto? É pena que os seus ensinamentos, tal como os seus erros, de nada tenham servido aos que, sem saberem como, herdaram o partido e a ribalta da elite angolana.
É pena que os que sempre tiveram a barriga cheia nada saibam, nem queiram saber, dos que militaram na fome, mas que se alimentaram com o orgulho de ter ao peito o Galo Negro. Se calhar também é pena que todos aqueles que viram na mandioca um manjar dos deuses estejam, como parece, rendidos à lagosta dos lugares de elite de Luanda.
Em síntese, se Adalberto se recordar de Savimbi e desta sua frase, “eu estou sempre acordado porque estou em constante movimento. Vocês é que estão a dormir… por isso é que o MPLA está a aldrabar-vos”, talvez um dia destes os angolanos (sobretudo os 20 milhões de pobres) olhem o céu e vejam o Galo Negro a voar.